Arquivo de julho, 2011

Formados na mesma escola

Publicado: 22/07/2011 em Política

A maioria dos cargos do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) que “pertenciam” ao PR já foi “tomada” pelo governo desde que estourou o escândalo no Ministério dos Transportes, começando com a queda do então titular da pasta, o ex-ministro Alfredo Nascimento. Todos os que foram demitidos haviam sido indicados pelo secretário-geral do partido, o mensaleiro Valdemar da Costa Neto. O diretor de Infraestrutura Rodoviária, Hideraldo Caron, único petista da cúpula do Dnit, pediu demissão hoje. Tudo indica que Luiz Antonio Pagot, diretor-geral do órgão, oficialmente em férias, também fará o mesmo ainda hoje. Pelo andar da carruagem, a faxina determinada por Dilma Rousseff no Ministério dos Transportes ainda não acabou.

Enquanto a presidente parece querer “extirpar” o mal, exonerando membros do PR que até então ocupavam órgãos do MT, alguns correligionários da base aliada e até mesmo Lula demonstram preocupação com a forma como as demissões têm sido conduzidas. Os primeiros reclamam que têm sido humilhantes os afastamentos a “conta-gotas”, conforme declarou esta semana o vice-líder do governo na Câmara, Luciano Castro (PR/RR). Já o ex-presidente não concorda com a “impaciência” com que Dilma tem tratado os envolvidos no escândalo e argumenta que isso pode trazer prejuízos políticos para ela, pois o partido promete retaliações.

Alguns setores da imprensa dirão que, enquanto Lula era mais tolerante com os casos de corrupção no seu governo e costumava afagar os acusados, sempre negando ter conhecimento sobre o que se passava debaixo de seu nariz, outros defenderão que Dilma tem agido corretamente ao começar a punir corruptos de forma rápida, ao contrário do que ocorreu em relação ao ex-ministro Antonio Palocci, cuja demissão aconteceu quase um mês depois de surgidas as primeiras denúncias sobre a “multiplicação” extraordinária de seu patrimônio.

Na verdade, ainda que seja lugar-comum afirmar isso, as aparências enganam. Dilma esteve, nos últimos anos, ao lado do ex-presidente e teve cargos importantes durante seu governo. Foi ministra de Minas e Energia e depois ocupou a estratégica chefia da Casa Civil, onde ficou conhecida pelo pulso firme e maneira centralizadora de conduzir a pasta. Sabe-se que ela delegava funções, mas fazia questão de estar a par de tudo que acontecia sob o seu comando. Ainda assim, não ficou livre das falcatruas em que se envolveu seu “ex-braço-direito” Erenice Guerra, quando esta assumiu a Casa Civil após a saída de Dilma para disputar a presidência em 2010.

Ainda à frente da Casa Civil no governo anterior, Dilma começou a ser “trabalhada” como possível sucessora de Lula. Foi idealizada como a “mãe do PAC” (Programa de Aceleração do Crescimento) e criou-se a imagem da “gerentona osso duro de roer”, candidata perfeita para dar continuidade ao sonho de poder do metalúrgico que fora alçado à condição de “pai dos pobres e oprimidos”. A inexperiência política de Dilma e as suas dificuldades em contornar crises todos nós já conhecíamos, o que ficou demonstrado nos seis primeiros meses de seu governo. Comprovou-se que a criatura não fora muito bem talhada pelo criador. Sabe-se que ela tem aversão ao “jogo político”, interessando-lhe mais a parte gerencial do cargo que ora ocupa.

Talvez isso explique a “pressa” em demitir todos os funcionários do Dnit ligados ao PR, e não uma suposta intolerância da presidente com a corrupção que se instalou no MT, afinal de contas ela e Lula foram formados na mesma escola e são do mesmo partido. Com a sutil diferença de que o ex-presidente não demonstra pudor ao tornar público seu modo de “fazer política”, aliando-se a quem quer que seja e buscando apoio irrestrito a qualquer custo para os seus “projetos”, não importando os meios utilizados e se os atuais aliados, a exemplo de Sarney e Collor, já foram, um dia, seus inimigos políticos. Dilma sabe, há muito tempo, como tudo acontece nos bastidores do poder, mas não tem “cacife”, jogo de cintura e nem força política para tratar diretamente de determinados “acordos” que lhe garantam a governabilidade.

Porém, um recuo a essa altura do campeonato deixaria a presidente em maus lençóis, pois além de ter uma base aliada fragmentada após a crise, a sua imagem diante da opinião pública sairia arranhada. Portanto, ela sabe ser necessário levar adiante a “faxina” (não apenas no Ministério dos Transportes), não cedendo às pressões do PR que agora ameaça deixar a base aliada e faz chantagens ao Planalto. Manter-se firme na limpeza seria uma garantia de que, ao menos, teria a simpatia e o apoio da população.

É, no mínimo, engraçado ver um partido atolado em corrupção exigindo uma “lealdade” que nem os honestos costumam cobrar abertamente. Os membros do PR se dizem “indignados” com a forma como seus apadrinhados foram demitidos e cobram da presidente um “tratamento adequado”, numa clara demonstração de que, em se tratando de política e milhões de reais em jogo, a cara-de-pau e a falta de limites são a marca registrada dessa turma.

A Copa de Lula

Publicado: 20/07/2011 em Cotidiano, Política

As recentes aparições em público do ex-presidente Lula têm demonstrado o quanto deve estar sendo difícil para ele “desencarnar” da presidência, como havia prometido tão logo deixou o cargo. Ele mesmo admitiu (primeiro, em discurso na abertura do 8º Congresso Nacional de Metalúrgicos da CUT (Central Única dos Trabalhadores), realizado no final de abril e, depois, em um outro encontro sindical ocorrido na semana passada) que “ainda não desencarnou totalmente do mandato de presidente”. Lula disse também que não daria palpites no governo de sua sucessora Dilma e “ensinaria como um ex-presidente deve se comportar”.

Não foi preciso acabar o primeiro semestre para o “animal político” falar mais alto e atropelar todas as tentativas de “discrição” do ex-presidente. Ele não se conteve e saiu dando “pitacos” sobre as últimas crises do governo Dilma, teve reuniões com parlamentares petistas, deu entrevistas e, recentemente, foi convidado e discursou nos congressos da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União Geral dos Trabalhadores.

No encontro com os estudantes da UNE, fez elogios rasgados a Fernando Haddad, ministro da Educação, e deixou claro que ele é o seu preferido para concorrer pelo PT à Prefeitura de São Paulo em 2012. Segundo Lula, Haddad “trabalhou duro para garantir que o pobre chegasse à universidade e foi o ministro que mais exerceu a democracia na relação com os estudantes e com os professores”. Na “rabeira” da disputa com Haddad estão a senadora Marta Suplicy e o ministro da Ciência e Tecnologia Aloízio Mercadante.

Apesar de toda a movimentação em torno de possíveis “apadrinhados” para as disputas municipais do ano que vem (não apenas em São Paulo), o ex-presidente dá evidências de que não saiu (e nem pretende fazê-lo tão cedo) da “vida política” e de todas as “implicações” que ela possa trazer. Para permanecer “vivo” na memória do povo brasileiro, Lula disse no último dia 15 que vai voltar a andar pelo Brasil e, como de costume, fez discurso inflamado em que defendeu as políticas econômicas adotadas durante o seu governo, mas não deixou de atacar “os outros”, ou seja, todos que fazem oposição a ele e, na sua concepção, invariavelmente, são inimigos do povo e da Nação.

Além de garantir que irá percorrer todo o País, Lula lançou um site para divulgar suas “atividades políticas” que conterá, ainda, a íntegra de discursos, fotos, vídeos e outros “penduricalhos”. Para quem prometia discrição, teremos de concordar que o ex-presidente tem agitado (e não paralelamente, mas como ator principal) o noticiário político nacional. Não bastassem as evidências da incapacidade política de sua sucessora, providencialmente “urdida” por ele para que o PT se mantenha no poder por um longo período, e todas as especulações (?!) sobre a sua influência no governo Dilma, o homem resolveu fazer barulho sobre os “arranjos” para as próximas eleições municipais, ainda que seus “planos” sejam maiores.

Em encontro com petistas ocorrido em abril deste ano, Lula afirmou que faz questão de participar das negociações para a corrida eleitoral de 2012, tendo como carro-chefe a disputa pela prefeitura paulistana. José Dirceu, réu do mensalão e apontado pelo STF como o “chefe da quadrilha” do escândalo de 2005, sob a aprovação do ex-presidente, será um dos estrategistas das articulações do próximo ano. Além do ex-ministro, João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara e também mensaleiro, participou da reunião que contou com 32 prefeitos, além de vice-prefeitos e deputados estaduais e federais.

Com o claro intuito de fortalecer o PT e seus aliados, “abocanhando” o maior número possível de prefeituras, Lula trilha um caminho cujo objetivo final todos já devem vislumbrar: seu retorno em 2014. A orquestração para que isso aconteça ocorre paralelamente ao governo de sua sucessora (ou “ponte”, como queiram) que não consegue se firmar como autoridade política máxima do País e continua dando margem para que o ex-presidente atue às escâncaras e mantenha (ou até mesmo aumente) seu capital político.

Não havendo legalidade para um terceiro mandato seguido, escolheu-se o intervalo de quatro anos em que a presidência seria “ocupada” por sua companheira petista apostando que um governo “dilmista” não emplacaria e seria algo “insosso” até o último dia de mandato (desconsiderando-se quaisquer desventuras pelo meio do caminho), o que faria o “povo” sentir saudades do “paizão dos desafortunados”. Ainda que seja cedo (nunca é no calendário político), parece que nem a própria Dilma teria “vontade” de disputar outra eleição ou chegaria com “fôlego” suficiente ao fim deste primeiro mandato para tentar um segundo.

A julgar pela “desarticulação” dos partidos de oposição, não será surpresa se o PT conseguir permanecer no poder pelo menos até 2022, o que por si só já é um cenário “aterrador”, tanto quanto a “velada” vontade de Lula de superar o seu colega Getúlio Vargas, que ficou no poder de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954. Como se deu o fim da era Vargas, todos nós sabemos. Quanto a Lula, ou a oposição se organiza imediatamente e começa a cumprir seu papel ou não estará muito longe o dia em que nos tornaremos um país de “partido único” e de um presidente sem limites, ainda que sejamos uma democracia, para o bem e para o mal.

O caminho mais fácil

Publicado: 18/07/2011 em Cotidiano

Uma avalanche de escândalos tem soterrado o noticiário nacional nos últimos tempos. São denúncias de corrupção, invariavelmente envolvendo a classe política, assaltos aos cofres públicos, negociatas envolvendo grandes obras, cargos em órgãos federais nas mãos de apadrinhados de “senhores feudais” que se apossaram vorazmente de quase todos os flancos do governo nas três esferas.

A situação se arrasta desde sempre e se infiltra em todos os setores da sociedade, em maior ou menor grau. Percebemos que a corrupção acontece em escolas, no seio da família, nos quartéis, nos poderes executivo, legislativo e judiciário, e até mesmo nas igrejas. Enfim, tem-se a impressão de que ninguém escapa das garras da “má conduta” e do “mau caratismo”.

Corrompemos e somos corrompidos, e a única coisa que parece variar é a percepção que se tem (quando se tem!) do grau de corrupção que nos envolve ou a avaliação (ou julgamento?) que fazemos dos casos escandalosos que nos saltam aos olhos. Ou seja, “relativizamos” as mazelas de tal forma que a culpa ou o erro se tornam “amenos” quando recaem sobre nós, mas são pesados quando se apontam as falhas alheias e se pretende julgar e condenar os ditos “prevaricadores”.

Não somos corruptos apenas quando praticamos desvios vultosos de dinheiro público, e nem apenas a classe política deve ser “enquadrada” nessa categoria. Somos corruptos, também, quando furamos filas, recebemos o troco errado e não o devolvemos, fazemos “gatos” de energia elétrica, TV a cabo e água, e cometemos tantos outros “pequenos” delitos e muitas vezes não nos damos conta da gravidade dos nossos “desvios de conduta” .

Apontamos as feridas dos outros, culpamos a classe política pelas nossas desgraças, mas nos esquecemos da nossa quase ou total “cumplicidade” e endêmica apatia ao tratarmos das coisas que deveriam, a princípio, nos incomodar. Acostumamo-nos aos maus exemplos e passamos a achar natural que o errado seja regra e não exceção. Além disso, não acreditamos numa possível “eficiência” da Justiça e preferimos levar ao pé da letra a sua tão propalada “cegueira”, principalmente quando se trata do lado mais fraco (ou sem recursos).

O Brasil parece ter “emperrado” e não consegue achar soluções para seus problemas. Educação, saúde e segurança pública são tratadas apenas em discursos de candidatos a algum cargo eletivo e, na maioria das vezes, as políticas públicas fazem parte de um “cronograma de intenções” que nunca sai do papel, servindo apenas para angariar votos.

O “retorno” que se dá à população não vem na forma de investimentos em setores cruciais para o nosso desenvolvimento, mas na manutenção dos mesmos vícios que corrompem as estruturas da sociedade e expõem as chagas de um sistema político constantemente fragilizado por denúncias e refém dos velhos caciques que pretendem perpetuar-se no poder e “cuidar” da coisa pública como se fosse privativa.

Parece-nos cada vez mais difícil acreditar que mudanças são possíveis, pois somos constantemente enganados (e nos deixamos enganar) pelos discursos e máscaras usados principalmente em época de campanha eleitoral. Na prática, o que se vê é um total “desestímulo” ao bom comportamento e à mudança de atitudes, pois os exemplos que “vêm de cima” nos mostram e parecem nos convencer que, a cada novo escândalo e a cada novo acobertamento de erros, o melhor caminho a se seguir é o da impunidade e da vida fácil conseguida através dos atalhos da incorreção e da vantagem a qualquer custo.

Corrupção desenfreada

Publicado: 16/07/2011 em Cotidiano, Política

Nesta sexta-feira, reportagem do jornal O Estado de São Paulo informou que o diretor-executivo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), José Henrique Sadok de Sá, é casado com Ana Paula Batista Araújo, dona da construtora Araújo Ltda., que tem contratos com o governo federal. Os “serviços” da construtora abarcam obras nas rodovias federais 174, 432 e 433 no estado de Roraima. Em cinco anos, a soma repassada para a empresa da mulher de Sadok chegou a R$ 18 milhões.

Em 2001, Sadok foi diretor de obras do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) em Roraima. Há seis anos, a Araújo Ltda. assinou um contrato de dois anos com o governo do Estado no valor de R$ 7,2 milhões para obras de “melhoria” na BR-174, cujas irregularidades já foram apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo dados do Portal da Transparência, foram liberados mais de R$ 200 milhões pela União para serem aplicados nessa rodovia nos últimos cinco anos.

Segundo o jornal, o contrato da Araújo Ltda. para “cuidar” da BR-174 rendeu três aditivos e um deles teria acrescentado mais R$ 1,5 milhão ao valor inicial e outro aumentou o prazo para três anos de validade. Ainda de acordo com O Estado de São Paulo, o convênio do governo de Roraima com o Ministério dos Transportes recebeu pelo menos sete acréscimos durante sua execução.

O mais interessante é que Sadok, além de ocupar a diretoria-executiva do Dnit, estava interinamente à frente da diretoria-geral após o afastamento do titular Luiz Antonio Pagot, que nesta semana prestou depoimentos ao Senado e à Câmara, quando negou que houvesse corrupção endêmica no Departamento e ressaltou a “extrema fiscalização” com que o órgão era tratado. Cinco horas de “explicações” na Câmara e mais oito no Senado talvez tenham cansado tanto o diretor-geral afastado a ponto de ele se esquecer que o seu assessor direto, Sadok, é marido da proprietária de uma construtora que tem contratos milionários com o governo.

Após as denúncias do jornal, o ministro Paulo Sérgio Oliveira Passos afastou imediatamente José Henrique Sadok e instaurou uma Comissão de Processo Administrativo Disciplinar. Também foi afastado ontem Frederico Augusto de Oliveira Dias, que fora identifcado como “boy” no depoimento de Pagot. O novo ministro disse não saber qual era a real função do “estafeta”. Na verdade, ele nunca foi oficialmente nomeado para nenhum cargo no governo, mas representava Pagot em viagens pelo País, exibindo crachá do Dnit e se reunindo com autoridades e prefeitos. O “boy” Fred, como é conhecido, tinha uma sala exclusiva, é filiado ao PR e indicação direta do mensaleiro Valdemar da Costa Neto.

Oliveira Passos sabe, ao menos, que todos os contratos da empresa da mulher de Sadok tiveram aditivos, em função do aumento de valores e prazos. O que mais ele saberia, sendo que está no Ministério há tanto tempo e sempre esteve ligado à cúpula que foi afastada e aos seus “braços-direitos”? O ministro afirmou ontem que, se for preciso, “ajustes” serão feitos, numa clara demonstração de que seguirá o que foi determinado por Dilma Roussef. O que se sabe é que ela ordenou, após as novas denúncias, que o ministro dos Transportes faça uma faxina geral no Ministério.

Desde o estouro do escândalo envolvendo o Ministério dos Transportes, que culminou inicialmente com a queda do ministro Alfredo Nascimento (PR) e o afastamento de Luiz Antonio Pagot, fica cada vez mais claro que essa pasta está nas mãos de quem não deveria, ou seja, do Partido da República e seus asseclas, que têm o simples propósito de atender a interesses escusos e enriquecer ilicitamente. É uma verdadeira apropriação do patrimônio público e a clara dilapidação de órgãos que deveriam estar a serviço da Nação.

Se analisarmos mais detalhadamente, não deixaremos de considerar que toda essa roubalheira vai além de um “simples caso de corrupção”. Deveria ser tratado como homicídio doloso, pois, enquanto o Ministério que deveria, entre tantas outras funções, cuidar das rodovias e ferrovias brasileiras, tem em seu quadro uma “máfia” que desvia milhões de reais, milhares de vidas são perdidas diariamente nas mal conservadas estradas brasileiras. São buracos e mais buracos que representam bem o rombo causado pela maculada administração pública.

Como já disse, não é preciso “queimar” muitos neurônios para perceber que a péssima situação das estradas brasileiras resulta do desvio de dinheiro, superfaturamento, propinas, acertos entre governos e empreiteiras e do famoso jeitinho brasileiro de se tirar vantagem em tudo, sempre seguindo a “linha de raciocínio” de que “se é público não é de ninguém, então qualquer um pode tomar posse”.

É preciso reestruturar todo o Ministério dos Transportes e seus órgãos, padronizando a qualidade das obras e fiscalizando rigorosamente os valores gastos em cada quilômetro, ainda que isso gere um custo político para a presidente. Não sendo assim, os desvios continuarão acontecendo descaradamente e os custos serão bem maiores, muito além do que Dilma possa imaginar.

O crime compensa!

Publicado: 15/07/2011 em Cotidiano, Política

O ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, conhecido popularmente como Lalau, foi acusado e condenado por desvio de recursos que deveriam ser utilizados para construção do prédio do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, cujas obras foram iniciadas em 1997. Ele, o empresário e ex-senador Luís Estevão, dono da construtora “OK” e Fábio Monteiro de Barros Filho, dono da construtora Incal Alumínio desviaram aproximadamente R$ 170 milhões dos cofres públicos, no período de 1994 a 1998. Ou seja, o desvio começou antes mesmo do “início” das obras.

A sangria do Tesouro só foi interrompida em 1998, quando o Ministério Público Federal (MPF) desconfiou do montante que era liberado diariamente para a obra do TRT (pouco mais de R$ 70 mil) e, um ano depois, com a criação da CPI do Judiciário, descobriu-se o tamanho do rombo: dos R$ 223,9 milhões que foram repassados, apenas R$ 53 milhões foram “devidamente” aplicados.

O juiz Lalau levava uma vida extravagante: gostava de andar em carros de luxo caríssimos e havia adquirido, na mesma época, um apartamento de U$ 800 mil em Miami. Sabe-se, também, que ele era “caridoso” ao dar gorjetas, especialmente quando estava de férias nos Estados Unidos. Garçons, funcionários dos hotéis de luxo em que costumava se hospedar e guardadores de carros eram agraciados com valores que chegavam a U$ 500.

Condenado em 2006 a pouco mais de 26 anos de prisão em regime fechado, o ex-juiz cumpre prisão domiciliar, desde 2007, por motivos de saúde. Suas contas foram bloqueadas desde 1999 e o apartamento de Miami foi seqüestrado pela Advocacia Geral da União (AGU) e vendido em 2002. O seu comparsa Luiz Estevão foi cassado em 2000 por quebra de decoro parlamentar (até então, nenhum senador havia perdido o mandato por esse motivo) e ficou inelegível por oito anos, pois foram encontradas provas incontestáveis que o ligavam à roubalheira comandada pelo juiz Lalau.

Nesta quinta-feira, 14, foi publicada no Diário Oficial de Justiça a decisão da 19ª Vara Federal “condenando” o ex-senador a devolver a quantia de R$ 55 milhões do total surrupiado e, segundo a AGU, trata-se da maior devolução aos cofres públicos de dinheiro desviado por corrupção de que se tem registro. Enquanto corriam as investigações e o processo na Justiça, diversos imóveis pertencentes a Luiz Estevão foram penhorados para pagamento da dívida que, inicialmente, era de R$ 169,5 milhões e até abril deste ano, com os valores corrigidos, já havia ultrapassado a quantia de R$ 1 bilhão.

Embora caiba recurso no Tribunal Regional Federal (TRF) e já tenha ocorrido o depósito dos R$ 55 milhões na Caixa Econômica, Luiz Estevão disse que não pretende recorrer, o que significa não apenas sua confissão de culpa, mas sinal de esperteza: o ex-senador acha melhor que o caso seja encerrado dessa maneira, pois irá pagar muito menos do que roubou (junto com o juiz Lalau) dos cofres públicos e do que pagaria em valores atuais.

Apesar do ineditismo (o valor tão alto a ser devolvido à União), achar que a punição aos culpados seguiu os rigores da Justiça soa como um escárnio à nossa inteligência. Luiz Estevão sai desse episódio em vantagem e atesta mais uma vez que, em alguns casos, o crime compensa. Lalau, cumprindo prisão domiciliar em luxuosa residência, até hoje não pagou os R$ 14,5 milhões alusivos à sua condenação.

Antes de chegar a esse valor, Luiz Estevão vinha travando longa batalha para, pelo menos, tentar parcelar o seu “débito” em 15 anos e ainda com desconto. No começo do ano, ele declarou que não se tratava de “assumir a culpa e nem estava arrependido”, apenas queria se livrar do “aperto financeiro” causado depois que as contas de suas empresas foram bloqueadas. Segundo consultoria contratada por ele e realizada em 2010, o seu patrimônio foi avaliado em R$ 20 bilhões.

A aplicação da Lei 12.249, sancionada por Lula em 2010, foi uma das últimas tentativas de seus advogados em tirar o seu cliente do “sufoco”, pois ela permite que qualquer dívida com autarquias e fundações seja parcelada em até 15 anos, com descontos acima de 40%.

O que se sabe é que a Secretaria do Patrimônio da União encontrou dificuldades para avaliar o patrimônio de Luiz Estevão devido ao seu “gigantismo”: além dos imóveis registrados em nome do ex-senador, há mais de 1,2 mil atribuídos a “laranjas”. Um advogado da União informou que não há pessoal suficiente para fazer o levantamento de todos os bens, então foram avaliados os mais “significativos”.

Enquanto “ladrões de galinha” penam por muitos anos atrás das grades imundas do nosso falido sistema carcerário, sem direito a um julgamento decente (quando há!), os de “colarinho branco” conseguem se safar dos “rigores” da lei e continuam agindo impunemente. Além de desviarem milhões de reais dos cofres públicos, quando “condenados” são “presenteados” com redução de valores, descontos, parcelamentos e uma infinidade de recursos conseguidos através de advogados muito bem pagos.

O cidadão comum continua sendo escorchado por altíssimos impostos nem sempre bem aplicados, “intimidado” a cumprir seu papel de contribuinte e a pagar suas contas em dia, sob pena de juros, multas, suspensão de serviços por atraso e tantas outras punições que parecem apenas recair sobre aqueles que se esforçam para agir decentemente. Aos corruptos e corruptores, dá-se a liberdade (até mesmo o incentivo) para que continuem praticando os mesmos crimes, numa clara demonstração de que em nosso País andar “fora da linha” pode ser sinônimo de sucesso.

Há quem diga que a queda-de-braço entre Dilma Rousseff e o Partido da República (PR) na escolha do novo ministro dos Transportes chegou ao fim na última terça-feira, dia 12, e a vitória foi da presidente ao bater o martelo e confirmar no cargo o secretário-executivo Paulo Sérgio Oliveira Passos, que estava à frente do Ministério interinamente desde a demissão de Alfredo Nascimento, dia 6. Vale lembrar que ele já substituiu o ex-ministro outras vezes, inclusive quando Nascimento se licenciou para tentar uma vaga no Senado, em 2006, e em 2010, quando concorreu ao governo do Amazonas, tendo sido derrotado.

A vitória de Dilma não passa de aparência. Ela fazia questão que Oliveira assumisse o MT por se tratar de um “técnico de carreira” que, teoricamente e embora filiado recentemente ao PR, estaria além dos embates partidários e daria ao Ministério uma “coloração” menos política. O PR se mostrava contrário à indicação desde o início pelo mesmo motivo, mas porque supostamente haveria menos liberdade para o partido ao não ter à frente da pasta um parlamentar pertencente ao seu quadro. A cúpula torcia para que o senador Blairo Maggi, ex-governador do Mato Grosso e um dos maiores produtores de soja do mundo, ficasse à frente do Ministério. Por “conflito de interesses” o senador não se mostrou favorável à sua indicação, pois suas empresas têm contratos com o governo federal e isso poderia atrapalhar os seus “negócios”, segundo declarações do próprio Maggi.

A bem da verdade, a nomeação de Oliveira Passos só confirma que, de uma forma ou de outra, o Ministério dos Transportes é propriedade única e exclusiva do PR e que Dilma não teve outras opções e, quaisquer que fossem elas, não haveria margem de manobra para se livrar das garras do partido de Valdemar da Costa Neto.

Costa Neto, para quem não se lembra, é um dos mensaleiros da era Lula que, para não ser cassado em 2005, resolveu renunciar ao cargo de deputado federal. Ele é o secretário-geral do PR, considerado um dos principais articuladores do partido e o homem que decide “quem assume o que no governo”, embora este venha tentando escondê-lo nos últimos dias. Dilma fez questão de deixar bem claro que, apesar de ter afastado Alfredo Nascimento, a escolha do novo ocupante do cargo ficaria a critério do PR, inclusive com a participação do ex-ministro.

Luiz Antonio Pagot, diretor afastado do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), órgão ligado ao Ministério dos Transportes e “entranhadamente” envolvido nos escândalos dos últimos dias, mostrou-se “descontente” com a maneira pela qual foi tratado pelo governo no início da crise. Imediatamente afastado do cargo após as denúncias da revista “Veja”, Pagot despachou normalmente até que saísse uma nota do MT informando suas férias. As especulações são a de que o diretor do Dnit será exonerado tão logo esse período acabe.

Com ameaças veladas ao governo e insinuações de que a campanha eleitoral de Dilma teria sido “beneficiada” pelos desvios do Ministério, além de dar sinais de que Paulo Bernardo, ministro das Comunicações, teria pressionado para que o Dnit acelerasse obras em seu estado, o Paraná, Pagot passou a ser considerado um “homem-bomba” que poderia aprofundar ainda mais a crise ministerial no depoimento que prestaria aos senadores nesta terça, dia 12.

Ao receber afagos do governo, o que ficou a cargo de Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, e perceber que não ficaria desamparado nem tampouco seria jogado aos leões, Pagot prestou um suave depoimento ao Senado, negando que a corrupção fosse algo impregnado no DNA do Dnit, como afirmam alguns, e que “ilicitudes” podem ter acontecido isoladamente. Apesar das denúncias, ele fez questão de ressaltar que o Dnit é “extremamente fiscalizado”, definiu-se como um excelente servidor e acusou a imprensa de criar factóides. Em depoimento à Câmara dos Deputados, na manhã desta quarta-feira, Pagot repetiu o tom ameno de ontem.

O diretor do Dnit fez elogios rasgados à Dilma Rousseff, dizendo ser este um governo que ele “admira e pelo qual trabalha alucinadamente” e disse que a presidente nunca foi omissa. Destacou que nunca sofreu pressões de Paulo Bernardo e que todas as decisões do Departamento eram tomadas por um colegiado que, inclusive, tem em seu quadro um membro do Partido dos Trabalhadores (PT), numa clara “redistribuição” de possível culpa pelos erros cometidos em sua gestão.

Ao mesmo tempo em que moderou o tom e não fez acusações contra o governo, Pagot se disse um excelente profissional e explanou durante cinco horas sobre o funcionamento do Dnit, esquivando-se de explicações sobre os casos de corrupção. Por outro lado, ao ser empossado como novo ministro dos Transportes, Paulo Sérgio de Oliveira Passos acenou com mudanças no Ministério e averiguações sobre as obras e licitações que estão sob denúncias de corrupção.

Ao ser efetivado, o novo ministro dos Transportes disse que irá fazer ajustes, mudar procedimentos e trocar funcionários, cercando-se de pessoas capacitadas. Não deixou de elogiar Luiz Antonio Pagot, chamando-o de responsável e competente, e confirmou que a sua permanência ou não no Dnit será uma decisão da presidente Dilma. Alguns analistas acreditam que o governo está sendo prudente e cercando Pagot de cuidados para que ele mantenha o mesmo discurso e não acuse o Planalto de conivência com a “sujeira” que há no Ministério. Ao terminar suas férias, será decidido se ele será exonerado ou se pedirá exoneração, o que deve ser entendido como um dos “ajustes” aos quais se referiu o novo titular da pasta.

O novo ministro, embora não seja um militante do PR, trabalhou nos últimos anos ao lado de Alfredo Nascimento, sendo considerado seu “braço-direito” e, como dito acima, assumiu interinamente o Ministério algumas vezes. Portanto, seria tolice imaginar que ele não estivesse a par do que acontecia no MT e não soubesse das falcatruas envolvendo a pasta. Muitos consideram que, por ele ser politicamente fraco, inclusive dentro do próprio partido, quem realmente continuará dando as cartas será a cúpula encabeçada por Valdemar da Costa Neto e Alfredo Nascimento.

Oliveira Passos assumiu o cargo elogiando o trabalho de seu antecessor, mas fazendo questão de ressaltar que o seu compromisso é com a honestidade. Trocou-se o ministro, afastou-se o diretor-geral do Dnit, mas o Ministério dos Transportes permanece sendo um “feudo” do PR. Além disso, os principais cargos do Ministério continuam ocupados pelos que foram indicados pelo partido e certamente acompanharam todas as “ilicitudes” que vem sendo praticadas há muito tempo e continuarão seguindo o mesmo roteiro, apesar das aparentes mudanças.

Aqueles renomados senhores (Krugman e Hobsbawn) devem ter analisado os oito anos de gestão do ex-presidente enclausurados em seus escritórios refrigerados, recebendo somente informações oficiais do governo, alimentadas única e exclusivamente por petistas. Encantaram-se perdidamente com a “comovente história” do nordestino pobre, semi-analfabeto, metalúrgico e líder sindical que chegou democraticamente à Presidência do Brasil, em um claro sinal de que mobilidade social neste País é possível, apesar das maquiagens marqueteiras, dos arranjos políticos e da dinheirama gasta em campanhas eleitorais.

As considerações de Paul Krugman e Eric Hobsbawn (alegremente acolhidas pelos repórteres de “Isto é”) ignoram os meios utilizados para manter a tão desejada “governabilidade” e o atendimento dos anseios da população carente, a despeito dos escândalos que assolaram os oito anos de governo Lula e, como vemos nos últimos dias, respingam na administração Dilma Rousseff.

A propósito do escândalo envolvendo o Ministério dos Transportes, que culminou na saída de Alfredo Nascimento (PR) do cargo, a mesma “reportagem” destaca que “o PAC, grande peça de campanha de Dilma Rousseff à Presidência, que recebeu investimentos de mais de R$ 25 bilhões só em rodovias, será utilizado como exemplo de política bem-sucedida”. Sem dúvidas, estamos vendo o sucesso da política de fraudes em licitações, com superfaturamento de obras, estradas esburacadas, ferrovias escangalhadas e cronograma furado.

O mais emblemático dos escândalos da era lulista, o “mensalão”, voltou à baila semana passada com a decisão do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que pediu a condenação de 36 dos 40 réus que participaram do esquema de corrupção, cujo objetivo principal era garantir maioria para o governo nas votações de projetos de seu interesse, através do pagamento de propinas a parlamentares. Ou seja, embora não esteja formalmente na lista dos acusados, Lula era o principal beneficiário.

Os aplaudidos senhores e os repórteres do semanário se esqueceram também de fazer referências ao caso Celso Daniel, à suposta ligação do PT com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), ao abastecimento dos cofres do MST (Movimento dos Sem Terra) com dinheiro público, ao escândalo dos cartões corporativos da Presidência, ao “valerioduto”, ao caso Lulinha, aos dólares na cueca, à quebra do sigilo bancário do caseiro, ao “mensalinho” do baixo clero, à CPI do apagão aéreo, ao caso Renan Calheiros, aos dossiês elaborados pela turma barra pesada do PT contra adversários políticos (ou seriam inimigos?!), etc. Foram tantos que não caberiam em tão poucas linhas.

São escândalos graves, denúncias que ainda estão frescas na memória de pessoas minimamente informadas, que conhecem “um pouco” da história recente do País. Que a revista tenha explícita sua “linha editorial” não é nenhum pecado, expondo suas preferências político-partidárias e deixando claro quem a financia. É sabido que todas elas têm um “manual de conduta”, ainda que muitas ajam “implicitamente”. Mas, deturpar a história endeusando uma “figura política”, ainda que sua popularidade tenha atingido recordes de aprovação e seu governo tenha méritos (e sabemos que eles existem), é um desserviço ao jornalismo e uma afronta ao bom-senso. Além do dinheiro (certeza de manutenção da revista e da garantia de circulação de seus exemplares), o que ela ganha com isso?

Em relação à afirmação do ex-presidente sobre palestras, sabe-se agora que se tratava de mais uma mentira deslavada. Não que seja pecado ministrá-las, ainda que sejam meramente explanações sobre os “casos” de sucesso de sua gestão e sobre sua “sofrida” vida pessoal. Lula não apenas começou a atuar nesse tipo de negócio como, segundo fontes do mercado, cobraria em torno de R$ 200 mil por cada apresentação em feiras e eventos de negócios, sendo o valor mais alto pago a um palestrante no País.

Especula-se que, nos primeiros meses como palestrante, incluindo os “trabalhos” realizados em outros países, ele já tenha ultrapassado a marca de R$ 1 milhão. Nesse ritmo, não demora muito para que o ex-presidente vá além dos R$ 3 milhões anuais pagos ao seu rival FHC como informado na “reportagem”.

Quanto à intenção de “ser um bom ex-presidente da República, sem atrapalhar quem estiver governando este país”, é sabido que não tem funcionado assim. Nos últimos “apertos” políticos que a sua sucessora teve, todos sabem do importante papel de Lula como “articulador político”, estando em Brasília ou não. Aliás, ele não se esforçou nem um pouco para se distanciar dos holofotes e, sempre que lhe foi dada oportunidade, serviu-se muito bem dos microfones de rádios e TVs para nos brindar com suas “caríssimas” opiniões sobre o cenário político nacional.

A impressão que fica (e estou sendo “otimista”) é a de que querem nos fazer acreditar que o ex-presidente é um bom exemplo para tudo e para todos, cuja biografia é impecável, “exemplo de vida” extremamente admirável e inédito. Confrontar esse “mito” e expor suas chagas é quase uma blasfêmia, um atentado à moral do que de mais “belo e santo” o Brasil viu ser construído nos últimos anos, além de estarmos indo, talvez por puro “capricho” e a despeito dos fatos, contra a maré da “paixão lulista”.

Aqueles que vêem os fatos à luz da verdade, são acusados de estar numa espécie de torcida contra o País, recheada de preconceitos e antipatia aos pobres que foram “amplamente” favorecidos pelas políticas “assistenciais” e de “inclusão” da era Lula. É o mais puro nivelamento por baixo do debate político (ou da tentativa deste) e um “convite” à ignorância e às inverdades históricas, que em nada contribuem para o real amadurecimento de uma sociedade, muito menos para a formação de caráter e de cidadãos.

“Na era Lula, que acaba agora, a economia cresceu muito bem, houve grande investimento na redução da pobreza, a inflação e a situação fiscal estão controladas e o mercado doméstico se fortaleceu. O que mais se deve esperar de um país?”. A “sentença” é de Paul Krugman, professor americano e Prêmio Nobel de Economia. Na mesma linha segue Eric Hobsbawn, historiador britânico: “Lula é o verdadeiro introdutor da democracia no Brasil. Ninguém havia feito o que ele fez no combate à desigualdade na história desse país”.

Esses trechos fazem parte de uma reportagem extremamente elogiosa da edição especial da revista “Isto é”, de dezembro de 2010, cujo título é “O brasileiro da década”. Por acaso, o exemplar chegou às minhas mãos e não pude deixar de ler e me deliciar com texto tão eloqüente sobre o nosso ex-presidente. Numa clara demonstração de imprensa chapa-branca e, por conseguinte, sem nenhum compromisso com a verdade dos fatos, os repórteres tecem loas escancaradas àquele que, segundo eles, despediu-se da Presidência com o prestígio e a popularidade em alta.

Para eles, Getúlio Vargas e Juscelino Kubitscheck, embora tenham sido presidentes carismáticos e populares, saíram do governo em baixa. O primeiro, com o “peso de uma ditadura sangrenta nas costas” e o segundo, além de ter que “passar a faixa para um opositor no final do mandato, deu início ao ciclo inflacionário”. Lula, como não poderia deixar de ser, “só tem pontos a seu favor”.

A revista segue prevendo um futuro auspicioso para o ex-presidente ao sair do cargo, afirmando que ele “deixará Brasília de cabeça erguida e sem temer a solidão que costuma abalar os que deixam o poder”. Ainda segundo a reportagem, Lula se dedicará às agendas interna e externa, “na frente nacional, ele deve acompanhar as reformas políticas no País. No exterior, seu alvo será a África e a América Latina”.

Aclamado pela “Isto é” como dono de um instinto incomum e poder de absorção e aprendizado extraordinários que, mesmo sem ter o ensino médio, superou a desconfiança inicial das elites, fez história no governo e adquiriu um status de líder mundial, Lula, “embora conserve até hoje hábitos dos duros tempos de São Bernardo do Campo, é considerado, atualmente, um homem refinado”.

Segue a reportagem (ou seria panfleto?!): “Não será surpresa se Lula percorrer universidades do País conscientizando a população sobre a necessidade do aperfeiçoamento do atual sistema político-eleitoral. O presidente descarta, contudo, entrar no circuito de palestras para empresários e intelectuais, a exemplo do que faz FHC, que chega a faturar cerca de R$ 3 milhões por ano. ‘Não é o meu perfil e não acho apropriado fazer fortunas com palestras’, tem afirmado Lula”.

Merecem destaque, também, nas 16 páginas dedicadas ao ex-presidente, as considerações de assessores próximos sobre a possibilidade de um retorno dele em 2014. Segundo eles, haveria duas situações bem distintas: uma delas, “leva em conta o êxito do governo Dilma”, o que seria aposta quase unânime entre os seus asseclas. A explicação seria a de que “ela já pegou a casa arrumada”. A outra hipótese seria a de que, se houver fracasso do atual governo, “o caminho estaria aberto para o terceiro mandato”, atendendo, assim, a um “novo ‘chamamento’ de políticos, intelectuais e representantes da sociedade civil”.

A revista afirma que a decisão sobre um possível retorno do ex-presidente em 2014 “caberá ao infalível instinto político de Luiz Inácio Lula da Silva e, certamente, o estadista da década acertará de novo”. Em 2002, conforme relata a “Isto é”, Lula havia declarado que era “a hora de mudar, de construir um país com mais dignidade e mais justiça”. Para arrematar, os repórteres concordam que “Lula chegou lá, mudou o Brasil e agora ele quer romper as fronteiras nacionais e ajudar a construir não só um país, mas um mundo melhor”. E chegam ao ápice do “puxa-saquismo” e do desserviço, afirmando: “Pelo seu histórico, Lula não falhará”.

Os mensaleiros de Lula

Publicado: 08/07/2011 em Cotidiano, Política

O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, solicitou que sejam condenados 36 dos 40 réus que participaram do esquema que ficou conhecido como mensalão, ocorrido no governo Lula em 2005. Entre eles estão José Dirceu, ex-ministro chefe da Casa Civil; Roberto Jefferson (PTB/RJ), então deputado federal e “dedo-duro” do escândalo; Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT (à época “expulso” do partido e readmitido recentemente) e o publicitário Marcos Valério.

Luís Gushiken, ex-ministro da Comunicação Social, foi excluído do processo por falta de provas e o deputado José Janene faleceu no ano passado. Sílvio Pereira, ex-secretário-geral, que ganhou um jipe Land Rover de presente de uma empreiteira que tinha contrato com a Petrobras, deixou de responder à acusação de formação de quadrilha, livrou-se da condenação por corrupção e fez um acordo com o Ministério Público para prestar serviços comunitários. Antonio Lamas (ex-tesoureiro do PL), que seria um dos intermediários de Valdemar da Costa Neto no esquema, também foi absolvido por falta de provas.

O esquema começou a ser investigado em 2005 e deu claros sinais de que o PT usava sobras de doações de campanha das eleições de 2002 para comprar deputados dos partidos da base, enquanto o publicitário Marcos Valério era o responsável por arrecadar propinas para os caixas dos aliados. Em 2007, o Supremo Tribunal Federal recebeu denúncias do ex-procurador-geral da República, Antonio Ferreira de Souza, e abriu uma ação contra os acusados. À época, José Dirceu foi apontado como o “chefe da quadrilha” e Marcos Valério como “líder operacional e financeiro” do esquema.

A decisão do procurador, que consta de um calhamaço de quase 400 páginas, é prova contundente contra os que atuaram na compra de deputados e na negociação de pagamentos em troca de votos de parlamentares. Para Roberto Gurgel, há evidências suficientes que caracterizam o “mensalão”, apesar de os envolvidos continuarem negando a sua existência e do apoio incondicional de muitos “simpatizantes” petistas que engrossam o coro dos que se recusam a admitir a roubalheira.

O PT e aliados costumam repetir que não houve mensalão, mas, sim, acertos de campanhas dos empréstimos feitos à Tesouraria do partido e não declarados à Justiça Eleitoral, conhecidos como “caixa 2”. De acordo com declarações do então presidente Lula, essa é uma prática comum e ocorre em qualquer campanha eleitoral. Antes disso, ele dizia, assim como em todos os outros casos de seu governo, não saber de absolutamente nada. Contrariando o ex-presidente e após mais de cinco anos de investigação processual, compilação de provas por meio de depoimentos e perícias, o procurador-geral concluiu que o crime realmente fora praticado.

Pouco tempo depois (em 2008 para ser mais exato), descobriu-se a ligação de telefônicas que injetaram milhões de reais no esquema do mensalão através da empresa de Marcos Valério, a DNA Propaganda, de Minas Gerais. As empresas Telemig e Amazônia Celular, controladas pelo banco Opportunity, pertencente a Daniel Dantas, eram financiadoras do que ficou conhecido como “valerioduto”, esquema para o pagamento dos mensaleiros.

Um dos maiores escândalos da história recente do País contou com a participação de parlamentares, ministros de Estado e empresários. Citando uma das frases preferidas do ex-presidente, “nunca antes na história deste país” a corrupção foi tão institucionalizada quanto sob seu governo. A mentira passou a ser verdade e, como dito ontem neste blog, os que denunciam e se opõem à prática da gatunagem estabelecida pelo “partido vermelho” são considerados “sabotadores e golpistas”.

A partir de agora, será dado um prazo para que os advogados dos réus apresentem suas defesas e, em seguida, o ministro do STF Joaquim Barbosa, relator do processo, será responsável pela elaboração de documento solicitando que o caso seja incluído na pauta de julgamentos do Supremo o que, segundo ele, pode ocorrer no final deste ano ou somente em 2012.

Não sei se caberia aqui a velha máxima de que “a justiça tarda, mas não falha”. Ainda há muita água para rolar sob a ponte, mas o fato de as denúncias terem sido devidamente embasadas e avalizadas pelo MPF não deixam dúvidas sobre a maneira “cancerosa” adotada pelo PT e demais partidos para tentarem garantir a “governabilidade”.

É a comprovação inequívoca de que os meios mais sujos foram aplicados para que se obtivesse um folgado apoio aos projetos do governo e à intenção de transformar a praxe lulo-petista no melhor modelo para lidar com as questões de caráter público e político, como jamais visto neste País, ainda que para isso atos criminosos sejam cometidos a torto e a direito, tornando-se o fio-condutor dessa gente sem escrúpulos.

P.S.: Ao comentar a decisão do procurador-geral da República, Roberto Jefferson, delator do “mensalão”, em entrevista nesta sexta-feira ao site Terra Magazine, foi irônico ao afirmar que “agora ficará difícil para Lula desmentir o mensalão”. Ele se referia à declaração do ex-presidente em que este tratou o esquema como uma “farsa”. Ainda segundo Jefferson, “é mais difícil para Lula desmoralizar o mensalão politicamente, pois o fato jurídico ainda está evoluindo, mas o político já se consolidou”.

O câncer de todos nós

Publicado: 07/07/2011 em Cotidiano, Política

A promiscuidade entre políticos e empreiteiras no Brasil é algo bem conhecido de todos e acontece há muito tempo. Fechar os olhos para isso é querer tapar o sol com a peneira e fingir que o nosso sistema não está corroído pela corrupção e pelo uso descarado da verba pública como se fosse algo privado, pertencente aos cofres particulares dos altos figurões envolvidos em esquemas de troca de favores, recebimento e pagamento de propinas, além dos valores exorbitantes colocados em caixas de campanha eleitoral.

As empreiteiras e os donos de grandes empresas dos mais variados segmentos costumam “investir” a torto e a direito em candidatos a cargos políticos, independentemente de filiação partidária, “corrente ideológica” ou das alianças com o único propósito de angariar o maior número de votos. Apesar disso, o que se percebe atualmente é que empreiteiros e empresários não têm, na maioria das vezes, preferência por nenhum candidato, pois costumam distribuir dinheiro indiscriminadamente. No final das contas, não importa quem seja o vencedor, e sim a certeza de que vantagens serão conseguidas como recompensa à “parceria”.

É uma espécie de loteria, mas que dá chances ao apostador de ganhar mesmo que ele não “acerte todos os números” necessários. O candidato eleito certamente ressarcirá os “investidores”, com favorecimento em licitações de obras, participação em negócios vultosos que envolvam o patrimônio público, distribuição de butins e a garantia de que, enquanto estiver no poder, desamparados não ficarão aqueles que apostaram tão alto.

O escândalo envolvendo o ex-ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, é só mais um dentre tantos outros aos quais nos “acostumamos” nas últimas décadas e com mais intensidade nos últimos nove anos. Parece que a “bandidagem” se profissionalizou, ganhando proporções jamais vistas ao tentar tomar conta do Estado de tal maneira que já não se distingue mais o que é público e o que é privado, o que é errado e o que é certo. Aos que denunciam os “deslizes” desses homens públicos, aplicam-se as pechas de “sabotadores e golpistas”, pois não seguem a cartilha dos que fabricam “verdades” de acordo com uma interpretação peculiar (e enviesada) do que seja moral e ética.

O Estado à serviço de interesses particulares e apropriado pelos que recusam pensamentos divergentes dos seus é a tônica do modo de se fazer “política” que presenciamos hoje em dia. Estamos sendo atropelados por uma “máquina” que desconhece limites e é avessa ao pudor, aos bons costumes e à ética. É, como já disse neste blog, a mão pesada do Estado utilizando-se dos piores meios para destruir a individualidade do cidadão e impor aos diversos segmentos da sociedade uma nova ordem de pensamentos e atitudes, desde que esteja em conformidade com o que pregam os novos paladinos da moralidade.

Por outro lado, não podemos culpar somente aqueles que estão no poder. A culpa também recai sobre nós, pois aceitamos facilmente o “jogo político”, as armações para eleger um ou outro candidato. Corrompemos e somos corrompidos pela prática do “toma lá, dá cá”, da troca de votos por benesses variadas, vestimos a camisa de um partido não porque nos identificamos com as possíveis propostas republicanas, mas porque vemos ali a possibilidade de alguma vantagem pessoal.

As empreiteiras, o empresariado e os políticos agem sem compromisso com a moralidade porque no Brasil tudo é permitido. As leis são desrespeitadas, os recursos jurídicos são infindáveis e os crimes do colarinho-branco quase sempre ficam impunes.

Do jeito que está, não há governabilidade que resista por muito tempo sem o apoio das conhecidíssimas alianças político-partidárias, que deixam os bem intencionados (sim, eles existem!) reféns de grupelhos interessados apenas em tirar sua parte dos gordos orçamentos públicos. O nosso “modelo político” não permite que governantes se sustentem sem a colaboração de velhos corruptos cujo principal instrumento de negociação é a chantagem política. Lamentavelmente, o horizonte é sombrio e não nos livraremos tão cedo do “câncer da corrupção” que destrói a passos largos a nossa sociedade.