Quando um Estado ou município dependem de decisões judiciais para afastar um mandatário ou alçar outro ao poder, alguma coisa parece estar errada. E quando o povo não sabe valorizar o seu voto e vive sob o constante suspense das análises jurídicas, liminares e recursos, que vão muito além do período eleitoral e se tornam uma espécie de “terceiro turno” sem prazo para acabar, percebemos que há falhas no sistema eleitoral, recheado de brechas que permitem os “vícios” do jogo do poder.

Vermelho, amarelo, roxo, rosa ou azul nada mais são do que símbolos, adotados individual ou coletivamente, para definir a “causa” e mostrar a todos “de que lado eu estou”, “em quem eu votei” e “quem me guarnece”. Há os que realmente são apaixonados pela causa, alguns muito lúcidos e que engrandecem o debate (quando há), primando pelo respeito ao adversário, às idéias contrárias e à rivalidade meramente político-partidária. Outros são vítimas de um tipo de paixão que cega, desrespeita e resvala para baixaria e ausência de idéias, onde a desqualificação do oponente e a ofensa são as armas preferidas. Fazem as apostas, mas se esquecem da compostura, das regras básicas da boa convivência.

Porém, para os desvalidos de informação e para os vitimados pela ignorância em sua forma mais bruta, as colorações partidárias dão lugar às sombras da incapacidade de raciocínio próprio e da falta de senso crítico, o que favorece a manutenção de um povo sob “cabresto” e inepto para fazer suas próprias escolhas, pois dependentes dos “pensamentos” alheios e das vontades de alguns.

Nessas circunstâncias, não importa se fulano, beltrano ou sicrano estão no poder porque representam a melhor opção. O que vale é o que essas “opções” podem trazer de benefícios a alguns, ainda que tantos outros permaneçam desassistidos porque o poder público lhes virou as costas. São desamparados pela parcialidade do Estado, pois é comum se esquecer que um governo democraticamente eleito é para todos e não para alguns. Eleitores de “A” e “B” vivem sob as mesmas regras e têm os mesmos direitos e deveres.

Os debates se esvaziaram e, em muitos casos, tornaram-se nonsense. Se instruídos fôssemos, as discussões se dariam em torno de idéias, de propostas. Se os candidatos, eleitos ou derrotados, agissem obedecendo ao rigor da lei, uma parte do tempo de mandato não seria perdida nos tribunais. Não teríamos tempo para ataques pessoais porque nossas atenções estariam, de fato, voltadas à coletividade.

Porém, o que se vê, é tal fragilidade eleitoral e política (e não me restrinjo à partidária) que atravanca o desenvolvimento de qualquer Estado, posto que amarrado a “tradições” dos tempos das Capitanias Hereditárias. Tudo parece um jogo de cartas (algumas vezes marcadas) em que o poder do “curinga” estará sempre ameaçado e seu valor mudará não por causa das possíveis “combinações” feitas pelos “parceiros de jogo”, e sim pelas “circunstâncias” decorrentes da aplicação imparcial das regras. Pelo menos, é o que se espera!

As denúncias sobre casos de corrupção envolvendo “primeiras-damas” em municípios de São Paulo e Alagoas, veiculadas no Fantástico deste domingo, revelam como algumas dessas senhoras costumam se comportar ao tratar a coisa pública como se privada fosse (sem trocadilhos, por favor!). Na maioria das vezes, ocupam pastas relacionadas ao “social”: Assistência Social, Bem-Estar Social, “combate a isso”, “combate àquilo”, enfim, sempre algum cargo em que a preocupação com os desvalidos é a principal bandeira! Maquiagem pura! Há, ainda, as que são nomeadas e nunca comparecem aos seus locais de trabalho, mas recebem os gordos salários religiosamente.

Na verdade, como demonstrado na reportagem e como em tantos outros casos que não repercutem nacionalmente, o interesse maior é, única e exclusivamente, o “bem-estar” pessoal! As secretarias e demais entidades servem apenas como vitrine e escada. Vitrine para que passem a imagem de bondosas senhoras, comprometidas com as questões sociais mais urgentes; e escada para que alcancem mais facilmente as empreiteiras e os empresários que contribuem para que o ciclo do “toma lá, dá cá” nunca se esgote e continue sendo alimentado por propinas e licitações fraudulentas.

Para que serve uma primeira-dama?! Isso não seria um ranço do nosso atraso político?! (ou de qualquer outro país?!). Vale lembrar que me refiro à importância que se dá a um título que existe “por tabela”. Vá lá, há os que digam que é só uma questão de status, algo que está atrelado ao ocupante do cargo (prefeito, governador, presidente). Mas, de forma alguma, essas senhoras deveriam estar à frente de secretarias, cargos, enfim, exercendo funções públicas apenas pelo fato de serem casadas com quem são.

Há primeiras-damas que fazem questão de ser discretas: algumas quase mudas, como Marisa Letícia, mulher do ex-presidente Lula; outras, ativas e de fato envolvidas em questões de cunho social, a exemplo de Ruth Cardoso, mulher de Fernando Henrique, falecida em 2008, mas que sempre rejeitou esse famigerado (no sentido pejorativo mesmo!) título. Enquanto seu marido esteve à frente da Presidência da República, Ruth Cardoso se preocupou com o combate à miséria e à desigualdade social, mas sem fazer alarde. Ela criou e presidiu o programa Comunidade Solidária e a organização não-governamental Comunitas. Ainda assim, nunca se valeu do seu status e não assumiu nenhum cargo por indicação de seu marido presidente.

As primeiras-damas denunciadas não ficam apenas nos bastidores, mas fazem questão de mostrar que mandam mais do que os próprios maridos eleitos. Em alguns casos, agem como se também tivessem mandato, como se tivessem sido escolhidas pelo povo. Um dos casos citados pelo Fantástico é o da primeira-dama de Campinas, Rosely Nassim Santos, conhecida, inclusive, por “mandar no prefeito”. Conforme declarou um promotor de Justiça, há indícios de que ela é “a mão firme” na administração do município, além de comandar um esquema criminoso que teria lucrado R$ 48 milhões com cobranças de propina e fraude em licitações.

Em Lagoa da Canoa, localizada em Alagoas, a primeira-dama Fabiana Lira, que também é secretária de Assistência Social, usou o dinheiro da merenda escolar da cidade de 18 mil habitantes para comprar seis litros de uísque, 24 garrafas de vinho e ração para cachorro. Ela havia sido presa em março, mas agora responde em liberdade. Em Taubaté, interior de São Paulo, o prefeito e a sua mulher Luciana também ficaram três dias no xilindró em junho deste ano, mas conseguiram um habeas-corpus. Segundo denúncias, a primeira-dama de Taubaté costumava receber de empresários jóias como recompensa pelas fraudes em licitações. O denunciante afirmou que eram consideradas “presentes, mimos”.

Assim como os casos denunciados no programa dominical, há milhares de outros espalhados pelo Brasil nos mais de 5.500 municípios. Não importa se a cidade é rica ou pobre, há sempre os que utilizam o poder público para tirar vantagens pessoais. Para se dar bem, não é necessário ter sido eleito. Os que estão próximos, por laços de sangue, mancebia ou contratos matrimoniais, sempre terão uma participação importante nos “negócios” da família.

Esses acontecimentos só nos dão a certeza de que as tão discriminadas “damas de bordel” (ou mulheres-damas, como são conhecidas em algumas regiões ou, simplesmente, damas, meretrizes, prostitutas) são muito mais dignas do nosso respeito e admiração do que algumas “primeiras-damas” que se arvoram representantes do povo e se dizem acima de qualquer suspeita, mas que apenas prostituem a própria honra para não perderem o status ou, simplesmente, adornarem seus corpos com “mimos” recebidos de empresários beneficiados pela roubalheira “oficial”.

P.S.: Se o “cargo” de primeira-dama é tão necessário, está mais do que na hora de a presidente Dilma Rousseff ter a sua!

A escola baiana do PT

Publicado: 26/08/2011 em Cotidiano, Economia, Política

Petista de carteirinha e fiel defensor do ex-presidente Lula e da presidente Dilma Rousseff, o governador da Bahia, Jaques Wagner, não se acanha ao afirmar que o “combate à corrupção não pode se tornar ‘bandeira’ do governo”. Ainda segundo ele, isso seria uma “desserviço” ao País, pois “não estamos em patamar (de corrupção) que assuste e no mundo todo há esse problema”. Utilizando-se, a exemplo da presidente, de eufemismo para tratar o que em qualquer país sério seria tipificado como crime (e em outros, os condenados receberiam como sentença a pena de morte), Wagner argumenta que Dilma tem feito apenas “ajustes de conduta” ao lidar com a roubalheira instalada na Esplanada dos Ministérios, o que resultou no afastamento de alguns ministros e funcionários de segundo escalão envolvidos em escândalos.

As declarações de Wagner foram feitas durante almoço com empresários de São Paulo ocorrido no dia 23. Ele também afirmou que, se Dilma não concorrer em 2014 e Lula estiver fora do páreo, será candidato à Presidência pelo PT. Mas, tentando dar um tom suave às suas especulações e para não causar intrigas entre os “companheiros”, o governador baiano disse que a sua prioridade para 2014 é trabalhar em prol da reeleição de Dilma e, caso ela não se candidate, antes de pensar em uma candidatura própria, Wagner se dedicaria de corpo e alma ao retorno do velho camarada.

Apenas para confirmar o que todos já sabíamos, Jaques Wagner aposta que não haverá ruptura entre Dilma e Lula, afirma que o ex-presidente tem um compromisso com este governo e, por esse motivo, “eles conversam toda semana e se encontram pessoalmente a cada 15 dias”. Como já dito algumas vezes aqui neste blog, o petista baiano apenas ratifica a influência lulista sobre o atual governo e a predisposição do antecessor da presidente em continuar agindo como uma “eminência parda”, como um conselheiro-mor de uma mandatária titubeante.

Filiado ao partido desde 1980, Wagner foi um dos fundadores do PT e da Central Única dos Trabalhadores (CUT) na Bahia. Tendo concorrido ao governo daquele Estado em 2002, perdeu para o então “carlista” Paulo Souto. A vitória em 2006 foi considerada por muitos como o fim do “carlismo”, símbolo máximo da fortíssima influência do falecido Antonio Carlos Magalhães (vulgo ACM ou, ainda, Toninho Malvadeza para os “íntimos”). Antes de ser eleito governador da Bahia, Jaques Wagner chegou a ser ministro do Trabalho e, em seguida, das Relações Institucionais no governo Lula.

Em seu segundo mandato, Wagner tem em seu currículo de governador índices não muito favoráveis, principalmente quando se trata de violência. Para se ter uma idéia, em 1997 havia 13 homicídios para cada 100 mil habitantes na Bahia e, dez anos depois, já sob a governança do petista, o número de homicídios chegou a 25,7 por 100 mil. Em 2010, subiu para 36. Baianos como eu, apesar de ausentes da “terrinha”, sabem muito bem a quantas anda a segurança pública, principalmente na capital do Estado. Registre-se que a taxa de homicídios em Salvador (61 por 100 mil) é duas vezes maior que a da cidade do Rio de Janeiro!

Os dados sobre a violência retratam números absurdos e as informações são da própria Secretaria de Segurança Pública da Bahia. Se há omissão naquilo que se apresenta, significa que a situação é bem pior na “terra da alegria”. Conforme dados da SESP/BA publicados no Jornal da Metrópole (semanário distribuído às sextas-feiras), do dia 20 ao 24 deste mês houve 25 homicídios, 20 tentativas de homicídio, 13 roubos a ônibus coletivos e 33 veículos roubados. A maioria dos assassinatos envolve moradores da periferia e estão, quase sempre, ligados ao tráfico de drogas.

Após o sucateamento de viaturas das polícias civil e militar, além da desativação de postos da PM estrategicamente localizados nas áreas mais violentas, o governo da Bahia anunciou recentemente que, para combater o narcotráfico, já existe um “mapa detalhado” e que serão adotadas as UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a exemplo do que acontece no Rio de Janeiro. Para quem não se lembra, trata-se daquela forma de combate ao crime em que se avisa aos bandidos onde e quando ocorrerá a ocupação pela polícia, dando-lhes chances de procurarem outras favelas, cidades ou Estados. Feito isto, convoca-se a mídia e anuncia-se à população a “volta da paz” onde antes reinava a insegurança.

O retrocesso do Estado sob a liderança de Wagner não se deu apenas no campo da segurança pública. A economia também sofre as conseqüências do desastrado governo petista: seguidamente, a Bahia perde investimentos para outros Estados da região Nordeste, principalmente para os vizinhos Pernambuco e Sergipe. Outro dado interessante, e não menos fatídico, é que, enquanto Recife diminui os seus índices de violência (ainda que sejam altíssimos), os de Salvador aumentam a uma velocidade assustadora. De acordo com o Mapa da Violência 2010/2011, a Bahia fica atrás apenas do Maranhão entre as unidades da Federação com maior crescimento no número de homicídios.

Com esse quadro nada favorável, Jaques Wagner tem a cara de pau de admitir que “está na fila” para concorrer à Presidência em 2014! É, no mínimo, fazer pouco caso da situação caótica em que se encontram a saúde e a segurança pública (só para ficar nesses dois exemplos) da Bahia. É querer vender uma imagem que não existe, pois muitos baianos o consideram (e de fato foi o que ele demonstrou nesses quase cinco anos de mandato) um péssimo administrador e um político cuja preocupação maior está bem longe do interesse dos baianos e bem próxima do Planalto Central.

Para se ter uma idéia do disparate e da irresponsabilidade do governo petista na Bahia, conforme reportagem da Folha de São Paulo, enquanto foram gastos, em 2009, R$26 milhões com segurança pública, o investimento em propaganda institucional (aquela que os governos costumam usar para pintar um quadro de fantasias e alegria) ultrapassou os R$108 milhões, ou seja, quatro vezes mais! Como se vê, não é fácil ser “alegre” na Bahia nem tampouco ficar “relaxado”, pois a tensão causada pela crescente violência está muito longe da colorida imagem vendida para turistas nacionais e estrangeiros.

É preciso ficar atento às intenções do filhote baiano do lulo-petismo e freá-las o quanto antes. Como bem se sabe, quando se trata de “trabalhar a imagem” de pretensos candidatos petistas, todas as armas são usadas, desde a elaboração de falsos dossiês contra potenciais adversários à negação da verdade (ainda que ela nos salte aos olhos) até as últimas conseqüências. É o que vimos nos últimos tempos e é o que continuamos a ver.

Figuras de linguagem

Publicado: 25/08/2011 em Cotidiano, Política

A tal “faxina” alardeada aos quatro ventos pela imprensa e por integrantes do governo Dilma não durou muito e acabou por sucumbir à imoralidade do nosso intrincado jogo político. Como se sabe, sem se render à velha forma de fazer política no Brasil, seu mandato correria sério risco ao perder “valiosos” apoios de políticos e partidos tão “interessados” no bem da Nação. A bem da governabilidade, é preciso andar em companhia dos ratos.

Reportagem da Folha de São Paulo de hoje informa que a presidente resolveu suspender a “faxina” para não perder aliados e conter o ímpeto subversivo dos insatisfeitos. É a sinalização de que operações para abafar maracutaias e denúncias de corrupção, a exemplo das que envolvem Aloízio Mercadante, Ideli Salvatti, Paulo Bernardo e Pedro Novais, serão mais utilizadas do que nunca.

Já escrevi em outros posts que o grande articulador político deste governo nunca foi Antonio Palocci e nunca será Ideli Salvatti. O mestre das negociações (ou negociatas) chama-se Lula. Em suas visitas à Brasília, em seus encontros com políticos da base aliada e até em “despachos” com ministros do governo Dilma, a principal preocupação do ex-presidente tem sido manter a “companheira” livre dos infortúnios, das ameaças e chantagens de corruptos não atendidos em suas “necessidades” mais básicas.

Para limpar o terreno, Lula não mede esforços. Age às escâncaras como se autoridade ainda fosse, e se tornou uma espécie de santo padroeiro da sua fraquinha sucessora. Ao seu lado, a presidente se apaga, não tem força suficiente para competir com o líder máximo da promiscuidade política dos últimos tempos. O ex-presidente “mexe os pauzinhos” para que sua “marca de governo” não se apague, ainda que o País não esteja mais, oficialmente, sendo presidido por ele.

Ao declarar que “o combate a irregularidades e demissões não são meta de governo”, Dilma segue o conselho das velhas raposas que sabem muito bem como funcionam os bastidores do poder. Não seria vantajoso continuar se indispondo com partidos da base aliada apenas por apego à moralidade. É preciso que se deixe roubar como sempre aconteceu, sem expor os larápios, ainda que flagrados no cometimento do delito. Não se pode expô-los ao vexame das algemas ou das fotos sem camisa ao serem presos, pois desagrada a muitos de seus pares que ainda estão no poder.

Dilma cedeu às chantagens do PR. Cedeu às pressões do PT e do PMDB. Deu declarações à imprensa, nesta quarta-feira, que tentam dar um tom de que tudo está “normal” como sempre esteve e que o País segue firme e forte rumo ao Primeiro Mundo. Corrupção desenfreada sempre existiu e continuará existindo, mas é preciso que experts em driblar crises “criadas” pela mídia tenham vez e voz neste governo, assim como tem sido nos últimos anos. Esse é o papel de Lula, esse é o destino de Sarney.

Não cabe a uma inexpressiva senhora recém-chegada ao poder tentar moralizar a política nacional. A verdadeira praga deste País, como tem sido demonstrado nesses nove anos de governo petista, é a “mídia”, a imprensa que tenta destruir a credibilidade e a reputação de pessoas tão ilibadas e cheias de boas intenções, realmente comprometidas com o progresso do Brasil.

Enquanto se puder esconder a lama sob o tapete, ninguém precisa se preocupar quanto dinheiro está sendo roubado aqui ou acolá. Como disse a própria presidente, usando de um eufemismo de extrema fineza para roubo, corrupção e desvio de conduta, “providências serão tomadas sempre que houver ‘malfeitos’ e ‘atividades inadequadas’ e que ‘faxina’ em seu governo se dará apenas contra a pobreza”.

É a velha forma lulo-petista de governar assumindo suas feições femininas, em que as metáforas futebolísticas (tão usadas pelo ex-presidente) são deixadas de lado e dão lugar a expressões mais suaves. Agora, seremos levados a acreditar, mais do que nunca, que “urubu” pode ser chamado de “papagaio” e que todo político é um poço de honestidade.

Depois de um mês sem atualizar este blog, constato que os assuntos em pauta no mundo político continuam os mesmos, só que cada vez mais recrudescidos, além de acelerados. O pessimismo toma conta e, pelo andar da carruagem, o cenário será o mesmo daqui a um mês ou dois anos. Continuarão pipocando as denúncias de corrupção, sejam elas nos Ministérios de Dilma Rousseff ou, simplesmente, onde houver um político brasileiro. Teremos notícias sobre o notório mau-caratismo da classe política, as intromissões do ex-presidente Lula no governo de sua sucessora e a eterna cara de pau do presidente do Senado, José Sarney.

Em pouco mais de um semestre, o governo Dilma ecoou aquilo que, erroneamente, chamamos de “herança maldita”. Assumo que tal classificação é rasa, pois não podemos nos esquecer que estamos sob a continuidade do lulo-petismo, aquela forma de governo em que, em nome de uma suposta governabilidade e da famigerada coalizão, todos os meios ilícitos são permitidos, toda a corrupção é aceita e todas as mentiras se tornam “verdade” segundo o manual de conduta de Lula e seus asseclas, que se instalaram no poder (ainda que democraticamente) e insistem em não “largar o osso” (algo nada republicano).

Ministros do atual governo, umbilicalmente ligados à Lula, foram demitidos por Dilma Rousseff. O primeiro foi Antonio Palocci, ex-ministro da Casa Civil, demitido em junho, depois de não ter conseguido explicar a origem de seu patrimônio astronômico e as suspeitas de sua atuação como lobista. Em seguida, Alfredo Nascimento, ex-ministro dos Transportes, foi afastado do cargo (e quase toda a cúpula do Ministério) sob suspeita de um esquema de superfaturamento em obras públicas e recebimento de propinas de empreiteiras.

Nelson Jobim, que também foi ministro do governo Lula, assim como Nascimento e Palocci, foi demitido no começo deste mês após as repercussões de sua entrevista à revista Piauí, em que criticava as ministras Ideli Salvatti, das Relações Institucionais, e Gleisi Hoffmann, ministra-chefe da Casa Civil. Como se sabe, as constantes declarações de Jobim, muito antes da reportagem da Piauí, já sinalizavam sua insatisfação com o governo Dilma, tendo até declarado que nas eleições de 2010 seu candidato foi José Serra.

Antes das demissões, houve uma “arrumação” entre dois Ministérios. Luiz Sérgio, que era ministro das Relações Institucionais, deu lugar à Ideli Salvatti, ex-ministra da Pesca e Aquicultura, pasta agora ocupada pelo ex-articulador político. Considerado fraco e sem expressão até mesmo entre os partidos aliados, Luiz Sérgio foi para um ministério apagado. Salvatti, por sua vez, ocupa agora uma área “delicada” para o governo, a despeito de toda sua indelicadeza e destempero quando senadora, época em que era umas das mais veementes defensoras do governo Lula.

Na semana passada, foi a vez de Wagner Rossi, até então ministro da Agricultura, sair do governo. Rossi “pediu” demissão após ter sido envolvido em denúncias de corrupção, a exemplo de licitações fraudulentas e pagamento de propina. As acusações começaram depois que o ex-diretor da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), Oscar Jucá Neto, irmão do líder do governo no Senado, Romero Jucá, foi demitido. Ele saiu afirmando que havia “bandidos” no órgão ao qual pertencia e insinuou que o ex-ministro fazia parte dos esquemas de corrupção.

Ainda estão na berlinda, além de Ideli Salvatti, os ministros da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, e do Turismo, Pedro Novais, cuja pasta está sob investigação da Polícia Federal por suspeita de desvios de recursos públicos. Foram expedidos 38 mandados de prisão e, dentre os que foram presos, estava Frederico Silva da Costa, que ocupava o segundo cargo mais importante do Ministério.

Segundo a revista Veja revelou em junho, Salvatti e Mercadante são acusados de comandar um esquema de elaboração de dossiês contra o candidato tucano José Serra nas eleições de 2006, que ficou conhecido como o “escândalo dos aloprados”. Desde que surgiram as primeiras denúncias contra a dupla, os aliados do governo têm feito de tudo para abafar o caso. Quais serão os próximos Ministérios envolvidos em escândalos? Quem serão os próximos demitidos?

A despeito da pretensa “faxina” e do combate à corrupção atribuídos à Dilma Rousseff, o que tem vindo à tona nos últimos meses é resultado direto da forma promíscua de governar de seu antecessor. Onde estava essa suposta “veia combativa” quando ela ocupou o principal Ministério (Casa Civil) no governo Lula? Todos dizem que a presidente sempre agiu com mãos de ferro e todas as decisões referentes àquela pasta eram avalizadas por ela e nada passava despercebido sob seu atento olhar de “gerentona”.

Sendo assim, o que podemos deduzir: Dilma sabia dos escândalos que se arrastam desde a era lulista e simplesmente fechou os olhos, sendo cúmplice da forma despudorada de governar do seu ex-chefe ou o “companheiro” era tão hábil nas negociações e negociatas que não levantava suspeitas nem entre os mais próximos? Para mim, pesa mais a primeira hipótese.

Como se sabe, Dilma nunca foi muito afeita ao jogo político, às negociações entre partidos, e isso se mostrou evidente já nos primeiros meses de seu governo. Agora, “vítima” das armadilhas e armações do poder, bate de frente com aqueles que lhe juraram apoio em troca das habituais vantagens e favores que “garantem a governabilidade”. Não sabemos ao certo se lhe aflorou uma forte vontade de pôr o governo nos eixos e se livrar de todas as ratazanas que se apossam do bem público como se privativo fosse, ou se ainda lhe falta “jogo de cintura” para lidar com essas criaturas.

Em meio aos escândalos dos últimos tempos e às consequentes demissões, perambulam os fantasmas de José Sarney e de Lula da Silva. Eles estão constantemente na mídia, dando suas “preciosas” opiniões sobre tudo, usando a “régua da moral” que eles bem entendem para analisar e medir os casos mais escabrosos de corrupção. É incrível como esses senhores relativizam a podridão no mundo político, dando-lhe uma leveza que só os profissionais das maracutaias conseguem.

Sarney é a representação máxima do que há de mais atrasado na política nacional e usa o Estado como se fosse o quintal de sua casa. Ontem, reportagem da Folha de São Paulo informou que o presidente do Senado usou helicóptero da Polícia Militar do Maranhão, governado por sua filha, para fins particulares. Questionado sobre o fato, ele disse que isso não prejudicou ninguém. Sabe-se que, enquanto as malas do “rei do Maranhão” estavam sendo descarregadas da aeronave, um paciente com traumatismo craniano teve que aguardar para ser atendido.

Lula, ao contrário do que prometeu, até hoje não “desencarnou” da Presidência e, volta e meia, dá palpites e se mete nas coisas do governo de sua sucessora, como se autoridade ainda fosse. Ainda hoje, a mesma Folha de São Paulo informa que o ex-presidente despachou ontem com dois subordinados de Dilma: Fernando Haddad, ministro da Educação, e Luís Inácio Adams, advogado-geral da União. Segundo a reportagem, o ex-presidente queria explicações sobre o piso nacional do magistério, cuja legislação foi promulgada em seu governo. Antes de sair da Presidência (ao menos, oficialmente), Lula mandava recados aos seus opositores, especialmente ao seu antecessor, Fernando Henrique, de que ensinaria como um ex-presidente deve se comportar. Vemos, cada vez mais, que ele está a anos-luz de ser bom exemplo, seja lá qual for a situação.

Enquanto políticos da estirpe de Lula e Sarney estiverem dando as cartas, não haverá “faxina” que tire o País do “empacamento” em que se encontra e a tal governabilidade só será garantida com as famigeradas trocas de favores, caminho fácil para corrupção e roubalheira desenfreadas. Ainda veremos muitos escândalos e muitos tentando colocá-los para debaixo do tapete. É desoladora a sensação de que não haverá “faxina” que dê jeito enquanto tivermos incrustado no nosso DNA a veia do mau-caratismo e da passividade ante os escândalos que nos acometem desde os tempos do Brasil Colônia.

Formados na mesma escola

Publicado: 22/07/2011 em Política

A maioria dos cargos do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) que “pertenciam” ao PR já foi “tomada” pelo governo desde que estourou o escândalo no Ministério dos Transportes, começando com a queda do então titular da pasta, o ex-ministro Alfredo Nascimento. Todos os que foram demitidos haviam sido indicados pelo secretário-geral do partido, o mensaleiro Valdemar da Costa Neto. O diretor de Infraestrutura Rodoviária, Hideraldo Caron, único petista da cúpula do Dnit, pediu demissão hoje. Tudo indica que Luiz Antonio Pagot, diretor-geral do órgão, oficialmente em férias, também fará o mesmo ainda hoje. Pelo andar da carruagem, a faxina determinada por Dilma Rousseff no Ministério dos Transportes ainda não acabou.

Enquanto a presidente parece querer “extirpar” o mal, exonerando membros do PR que até então ocupavam órgãos do MT, alguns correligionários da base aliada e até mesmo Lula demonstram preocupação com a forma como as demissões têm sido conduzidas. Os primeiros reclamam que têm sido humilhantes os afastamentos a “conta-gotas”, conforme declarou esta semana o vice-líder do governo na Câmara, Luciano Castro (PR/RR). Já o ex-presidente não concorda com a “impaciência” com que Dilma tem tratado os envolvidos no escândalo e argumenta que isso pode trazer prejuízos políticos para ela, pois o partido promete retaliações.

Alguns setores da imprensa dirão que, enquanto Lula era mais tolerante com os casos de corrupção no seu governo e costumava afagar os acusados, sempre negando ter conhecimento sobre o que se passava debaixo de seu nariz, outros defenderão que Dilma tem agido corretamente ao começar a punir corruptos de forma rápida, ao contrário do que ocorreu em relação ao ex-ministro Antonio Palocci, cuja demissão aconteceu quase um mês depois de surgidas as primeiras denúncias sobre a “multiplicação” extraordinária de seu patrimônio.

Na verdade, ainda que seja lugar-comum afirmar isso, as aparências enganam. Dilma esteve, nos últimos anos, ao lado do ex-presidente e teve cargos importantes durante seu governo. Foi ministra de Minas e Energia e depois ocupou a estratégica chefia da Casa Civil, onde ficou conhecida pelo pulso firme e maneira centralizadora de conduzir a pasta. Sabe-se que ela delegava funções, mas fazia questão de estar a par de tudo que acontecia sob o seu comando. Ainda assim, não ficou livre das falcatruas em que se envolveu seu “ex-braço-direito” Erenice Guerra, quando esta assumiu a Casa Civil após a saída de Dilma para disputar a presidência em 2010.

Ainda à frente da Casa Civil no governo anterior, Dilma começou a ser “trabalhada” como possível sucessora de Lula. Foi idealizada como a “mãe do PAC” (Programa de Aceleração do Crescimento) e criou-se a imagem da “gerentona osso duro de roer”, candidata perfeita para dar continuidade ao sonho de poder do metalúrgico que fora alçado à condição de “pai dos pobres e oprimidos”. A inexperiência política de Dilma e as suas dificuldades em contornar crises todos nós já conhecíamos, o que ficou demonstrado nos seis primeiros meses de seu governo. Comprovou-se que a criatura não fora muito bem talhada pelo criador. Sabe-se que ela tem aversão ao “jogo político”, interessando-lhe mais a parte gerencial do cargo que ora ocupa.

Talvez isso explique a “pressa” em demitir todos os funcionários do Dnit ligados ao PR, e não uma suposta intolerância da presidente com a corrupção que se instalou no MT, afinal de contas ela e Lula foram formados na mesma escola e são do mesmo partido. Com a sutil diferença de que o ex-presidente não demonstra pudor ao tornar público seu modo de “fazer política”, aliando-se a quem quer que seja e buscando apoio irrestrito a qualquer custo para os seus “projetos”, não importando os meios utilizados e se os atuais aliados, a exemplo de Sarney e Collor, já foram, um dia, seus inimigos políticos. Dilma sabe, há muito tempo, como tudo acontece nos bastidores do poder, mas não tem “cacife”, jogo de cintura e nem força política para tratar diretamente de determinados “acordos” que lhe garantam a governabilidade.

Porém, um recuo a essa altura do campeonato deixaria a presidente em maus lençóis, pois além de ter uma base aliada fragmentada após a crise, a sua imagem diante da opinião pública sairia arranhada. Portanto, ela sabe ser necessário levar adiante a “faxina” (não apenas no Ministério dos Transportes), não cedendo às pressões do PR que agora ameaça deixar a base aliada e faz chantagens ao Planalto. Manter-se firme na limpeza seria uma garantia de que, ao menos, teria a simpatia e o apoio da população.

É, no mínimo, engraçado ver um partido atolado em corrupção exigindo uma “lealdade” que nem os honestos costumam cobrar abertamente. Os membros do PR se dizem “indignados” com a forma como seus apadrinhados foram demitidos e cobram da presidente um “tratamento adequado”, numa clara demonstração de que, em se tratando de política e milhões de reais em jogo, a cara-de-pau e a falta de limites são a marca registrada dessa turma.

A Copa de Lula

Publicado: 20/07/2011 em Cotidiano, Política

As recentes aparições em público do ex-presidente Lula têm demonstrado o quanto deve estar sendo difícil para ele “desencarnar” da presidência, como havia prometido tão logo deixou o cargo. Ele mesmo admitiu (primeiro, em discurso na abertura do 8º Congresso Nacional de Metalúrgicos da CUT (Central Única dos Trabalhadores), realizado no final de abril e, depois, em um outro encontro sindical ocorrido na semana passada) que “ainda não desencarnou totalmente do mandato de presidente”. Lula disse também que não daria palpites no governo de sua sucessora Dilma e “ensinaria como um ex-presidente deve se comportar”.

Não foi preciso acabar o primeiro semestre para o “animal político” falar mais alto e atropelar todas as tentativas de “discrição” do ex-presidente. Ele não se conteve e saiu dando “pitacos” sobre as últimas crises do governo Dilma, teve reuniões com parlamentares petistas, deu entrevistas e, recentemente, foi convidado e discursou nos congressos da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União Geral dos Trabalhadores.

No encontro com os estudantes da UNE, fez elogios rasgados a Fernando Haddad, ministro da Educação, e deixou claro que ele é o seu preferido para concorrer pelo PT à Prefeitura de São Paulo em 2012. Segundo Lula, Haddad “trabalhou duro para garantir que o pobre chegasse à universidade e foi o ministro que mais exerceu a democracia na relação com os estudantes e com os professores”. Na “rabeira” da disputa com Haddad estão a senadora Marta Suplicy e o ministro da Ciência e Tecnologia Aloízio Mercadante.

Apesar de toda a movimentação em torno de possíveis “apadrinhados” para as disputas municipais do ano que vem (não apenas em São Paulo), o ex-presidente dá evidências de que não saiu (e nem pretende fazê-lo tão cedo) da “vida política” e de todas as “implicações” que ela possa trazer. Para permanecer “vivo” na memória do povo brasileiro, Lula disse no último dia 15 que vai voltar a andar pelo Brasil e, como de costume, fez discurso inflamado em que defendeu as políticas econômicas adotadas durante o seu governo, mas não deixou de atacar “os outros”, ou seja, todos que fazem oposição a ele e, na sua concepção, invariavelmente, são inimigos do povo e da Nação.

Além de garantir que irá percorrer todo o País, Lula lançou um site para divulgar suas “atividades políticas” que conterá, ainda, a íntegra de discursos, fotos, vídeos e outros “penduricalhos”. Para quem prometia discrição, teremos de concordar que o ex-presidente tem agitado (e não paralelamente, mas como ator principal) o noticiário político nacional. Não bastassem as evidências da incapacidade política de sua sucessora, providencialmente “urdida” por ele para que o PT se mantenha no poder por um longo período, e todas as especulações (?!) sobre a sua influência no governo Dilma, o homem resolveu fazer barulho sobre os “arranjos” para as próximas eleições municipais, ainda que seus “planos” sejam maiores.

Em encontro com petistas ocorrido em abril deste ano, Lula afirmou que faz questão de participar das negociações para a corrida eleitoral de 2012, tendo como carro-chefe a disputa pela prefeitura paulistana. José Dirceu, réu do mensalão e apontado pelo STF como o “chefe da quadrilha” do escândalo de 2005, sob a aprovação do ex-presidente, será um dos estrategistas das articulações do próximo ano. Além do ex-ministro, João Paulo Cunha, ex-presidente da Câmara e também mensaleiro, participou da reunião que contou com 32 prefeitos, além de vice-prefeitos e deputados estaduais e federais.

Com o claro intuito de fortalecer o PT e seus aliados, “abocanhando” o maior número possível de prefeituras, Lula trilha um caminho cujo objetivo final todos já devem vislumbrar: seu retorno em 2014. A orquestração para que isso aconteça ocorre paralelamente ao governo de sua sucessora (ou “ponte”, como queiram) que não consegue se firmar como autoridade política máxima do País e continua dando margem para que o ex-presidente atue às escâncaras e mantenha (ou até mesmo aumente) seu capital político.

Não havendo legalidade para um terceiro mandato seguido, escolheu-se o intervalo de quatro anos em que a presidência seria “ocupada” por sua companheira petista apostando que um governo “dilmista” não emplacaria e seria algo “insosso” até o último dia de mandato (desconsiderando-se quaisquer desventuras pelo meio do caminho), o que faria o “povo” sentir saudades do “paizão dos desafortunados”. Ainda que seja cedo (nunca é no calendário político), parece que nem a própria Dilma teria “vontade” de disputar outra eleição ou chegaria com “fôlego” suficiente ao fim deste primeiro mandato para tentar um segundo.

A julgar pela “desarticulação” dos partidos de oposição, não será surpresa se o PT conseguir permanecer no poder pelo menos até 2022, o que por si só já é um cenário “aterrador”, tanto quanto a “velada” vontade de Lula de superar o seu colega Getúlio Vargas, que ficou no poder de 1930 a 1945 e de 1951 a 1954. Como se deu o fim da era Vargas, todos nós sabemos. Quanto a Lula, ou a oposição se organiza imediatamente e começa a cumprir seu papel ou não estará muito longe o dia em que nos tornaremos um país de “partido único” e de um presidente sem limites, ainda que sejamos uma democracia, para o bem e para o mal.

O caminho mais fácil

Publicado: 18/07/2011 em Cotidiano

Uma avalanche de escândalos tem soterrado o noticiário nacional nos últimos tempos. São denúncias de corrupção, invariavelmente envolvendo a classe política, assaltos aos cofres públicos, negociatas envolvendo grandes obras, cargos em órgãos federais nas mãos de apadrinhados de “senhores feudais” que se apossaram vorazmente de quase todos os flancos do governo nas três esferas.

A situação se arrasta desde sempre e se infiltra em todos os setores da sociedade, em maior ou menor grau. Percebemos que a corrupção acontece em escolas, no seio da família, nos quartéis, nos poderes executivo, legislativo e judiciário, e até mesmo nas igrejas. Enfim, tem-se a impressão de que ninguém escapa das garras da “má conduta” e do “mau caratismo”.

Corrompemos e somos corrompidos, e a única coisa que parece variar é a percepção que se tem (quando se tem!) do grau de corrupção que nos envolve ou a avaliação (ou julgamento?) que fazemos dos casos escandalosos que nos saltam aos olhos. Ou seja, “relativizamos” as mazelas de tal forma que a culpa ou o erro se tornam “amenos” quando recaem sobre nós, mas são pesados quando se apontam as falhas alheias e se pretende julgar e condenar os ditos “prevaricadores”.

Não somos corruptos apenas quando praticamos desvios vultosos de dinheiro público, e nem apenas a classe política deve ser “enquadrada” nessa categoria. Somos corruptos, também, quando furamos filas, recebemos o troco errado e não o devolvemos, fazemos “gatos” de energia elétrica, TV a cabo e água, e cometemos tantos outros “pequenos” delitos e muitas vezes não nos damos conta da gravidade dos nossos “desvios de conduta” .

Apontamos as feridas dos outros, culpamos a classe política pelas nossas desgraças, mas nos esquecemos da nossa quase ou total “cumplicidade” e endêmica apatia ao tratarmos das coisas que deveriam, a princípio, nos incomodar. Acostumamo-nos aos maus exemplos e passamos a achar natural que o errado seja regra e não exceção. Além disso, não acreditamos numa possível “eficiência” da Justiça e preferimos levar ao pé da letra a sua tão propalada “cegueira”, principalmente quando se trata do lado mais fraco (ou sem recursos).

O Brasil parece ter “emperrado” e não consegue achar soluções para seus problemas. Educação, saúde e segurança pública são tratadas apenas em discursos de candidatos a algum cargo eletivo e, na maioria das vezes, as políticas públicas fazem parte de um “cronograma de intenções” que nunca sai do papel, servindo apenas para angariar votos.

O “retorno” que se dá à população não vem na forma de investimentos em setores cruciais para o nosso desenvolvimento, mas na manutenção dos mesmos vícios que corrompem as estruturas da sociedade e expõem as chagas de um sistema político constantemente fragilizado por denúncias e refém dos velhos caciques que pretendem perpetuar-se no poder e “cuidar” da coisa pública como se fosse privativa.

Parece-nos cada vez mais difícil acreditar que mudanças são possíveis, pois somos constantemente enganados (e nos deixamos enganar) pelos discursos e máscaras usados principalmente em época de campanha eleitoral. Na prática, o que se vê é um total “desestímulo” ao bom comportamento e à mudança de atitudes, pois os exemplos que “vêm de cima” nos mostram e parecem nos convencer que, a cada novo escândalo e a cada novo acobertamento de erros, o melhor caminho a se seguir é o da impunidade e da vida fácil conseguida através dos atalhos da incorreção e da vantagem a qualquer custo.

Corrupção desenfreada

Publicado: 16/07/2011 em Cotidiano, Política

Nesta sexta-feira, reportagem do jornal O Estado de São Paulo informou que o diretor-executivo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), José Henrique Sadok de Sá, é casado com Ana Paula Batista Araújo, dona da construtora Araújo Ltda., que tem contratos com o governo federal. Os “serviços” da construtora abarcam obras nas rodovias federais 174, 432 e 433 no estado de Roraima. Em cinco anos, a soma repassada para a empresa da mulher de Sadok chegou a R$ 18 milhões.

Em 2001, Sadok foi diretor de obras do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) em Roraima. Há seis anos, a Araújo Ltda. assinou um contrato de dois anos com o governo do Estado no valor de R$ 7,2 milhões para obras de “melhoria” na BR-174, cujas irregularidades já foram apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo dados do Portal da Transparência, foram liberados mais de R$ 200 milhões pela União para serem aplicados nessa rodovia nos últimos cinco anos.

Segundo o jornal, o contrato da Araújo Ltda. para “cuidar” da BR-174 rendeu três aditivos e um deles teria acrescentado mais R$ 1,5 milhão ao valor inicial e outro aumentou o prazo para três anos de validade. Ainda de acordo com O Estado de São Paulo, o convênio do governo de Roraima com o Ministério dos Transportes recebeu pelo menos sete acréscimos durante sua execução.

O mais interessante é que Sadok, além de ocupar a diretoria-executiva do Dnit, estava interinamente à frente da diretoria-geral após o afastamento do titular Luiz Antonio Pagot, que nesta semana prestou depoimentos ao Senado e à Câmara, quando negou que houvesse corrupção endêmica no Departamento e ressaltou a “extrema fiscalização” com que o órgão era tratado. Cinco horas de “explicações” na Câmara e mais oito no Senado talvez tenham cansado tanto o diretor-geral afastado a ponto de ele se esquecer que o seu assessor direto, Sadok, é marido da proprietária de uma construtora que tem contratos milionários com o governo.

Após as denúncias do jornal, o ministro Paulo Sérgio Oliveira Passos afastou imediatamente José Henrique Sadok e instaurou uma Comissão de Processo Administrativo Disciplinar. Também foi afastado ontem Frederico Augusto de Oliveira Dias, que fora identifcado como “boy” no depoimento de Pagot. O novo ministro disse não saber qual era a real função do “estafeta”. Na verdade, ele nunca foi oficialmente nomeado para nenhum cargo no governo, mas representava Pagot em viagens pelo País, exibindo crachá do Dnit e se reunindo com autoridades e prefeitos. O “boy” Fred, como é conhecido, tinha uma sala exclusiva, é filiado ao PR e indicação direta do mensaleiro Valdemar da Costa Neto.

Oliveira Passos sabe, ao menos, que todos os contratos da empresa da mulher de Sadok tiveram aditivos, em função do aumento de valores e prazos. O que mais ele saberia, sendo que está no Ministério há tanto tempo e sempre esteve ligado à cúpula que foi afastada e aos seus “braços-direitos”? O ministro afirmou ontem que, se for preciso, “ajustes” serão feitos, numa clara demonstração de que seguirá o que foi determinado por Dilma Roussef. O que se sabe é que ela ordenou, após as novas denúncias, que o ministro dos Transportes faça uma faxina geral no Ministério.

Desde o estouro do escândalo envolvendo o Ministério dos Transportes, que culminou inicialmente com a queda do ministro Alfredo Nascimento (PR) e o afastamento de Luiz Antonio Pagot, fica cada vez mais claro que essa pasta está nas mãos de quem não deveria, ou seja, do Partido da República e seus asseclas, que têm o simples propósito de atender a interesses escusos e enriquecer ilicitamente. É uma verdadeira apropriação do patrimônio público e a clara dilapidação de órgãos que deveriam estar a serviço da Nação.

Se analisarmos mais detalhadamente, não deixaremos de considerar que toda essa roubalheira vai além de um “simples caso de corrupção”. Deveria ser tratado como homicídio doloso, pois, enquanto o Ministério que deveria, entre tantas outras funções, cuidar das rodovias e ferrovias brasileiras, tem em seu quadro uma “máfia” que desvia milhões de reais, milhares de vidas são perdidas diariamente nas mal conservadas estradas brasileiras. São buracos e mais buracos que representam bem o rombo causado pela maculada administração pública.

Como já disse, não é preciso “queimar” muitos neurônios para perceber que a péssima situação das estradas brasileiras resulta do desvio de dinheiro, superfaturamento, propinas, acertos entre governos e empreiteiras e do famoso jeitinho brasileiro de se tirar vantagem em tudo, sempre seguindo a “linha de raciocínio” de que “se é público não é de ninguém, então qualquer um pode tomar posse”.

É preciso reestruturar todo o Ministério dos Transportes e seus órgãos, padronizando a qualidade das obras e fiscalizando rigorosamente os valores gastos em cada quilômetro, ainda que isso gere um custo político para a presidente. Não sendo assim, os desvios continuarão acontecendo descaradamente e os custos serão bem maiores, muito além do que Dilma possa imaginar.

O crime compensa!

Publicado: 15/07/2011 em Cotidiano, Política

O ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, conhecido popularmente como Lalau, foi acusado e condenado por desvio de recursos que deveriam ser utilizados para construção do prédio do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, cujas obras foram iniciadas em 1997. Ele, o empresário e ex-senador Luís Estevão, dono da construtora “OK” e Fábio Monteiro de Barros Filho, dono da construtora Incal Alumínio desviaram aproximadamente R$ 170 milhões dos cofres públicos, no período de 1994 a 1998. Ou seja, o desvio começou antes mesmo do “início” das obras.

A sangria do Tesouro só foi interrompida em 1998, quando o Ministério Público Federal (MPF) desconfiou do montante que era liberado diariamente para a obra do TRT (pouco mais de R$ 70 mil) e, um ano depois, com a criação da CPI do Judiciário, descobriu-se o tamanho do rombo: dos R$ 223,9 milhões que foram repassados, apenas R$ 53 milhões foram “devidamente” aplicados.

O juiz Lalau levava uma vida extravagante: gostava de andar em carros de luxo caríssimos e havia adquirido, na mesma época, um apartamento de U$ 800 mil em Miami. Sabe-se, também, que ele era “caridoso” ao dar gorjetas, especialmente quando estava de férias nos Estados Unidos. Garçons, funcionários dos hotéis de luxo em que costumava se hospedar e guardadores de carros eram agraciados com valores que chegavam a U$ 500.

Condenado em 2006 a pouco mais de 26 anos de prisão em regime fechado, o ex-juiz cumpre prisão domiciliar, desde 2007, por motivos de saúde. Suas contas foram bloqueadas desde 1999 e o apartamento de Miami foi seqüestrado pela Advocacia Geral da União (AGU) e vendido em 2002. O seu comparsa Luiz Estevão foi cassado em 2000 por quebra de decoro parlamentar (até então, nenhum senador havia perdido o mandato por esse motivo) e ficou inelegível por oito anos, pois foram encontradas provas incontestáveis que o ligavam à roubalheira comandada pelo juiz Lalau.

Nesta quinta-feira, 14, foi publicada no Diário Oficial de Justiça a decisão da 19ª Vara Federal “condenando” o ex-senador a devolver a quantia de R$ 55 milhões do total surrupiado e, segundo a AGU, trata-se da maior devolução aos cofres públicos de dinheiro desviado por corrupção de que se tem registro. Enquanto corriam as investigações e o processo na Justiça, diversos imóveis pertencentes a Luiz Estevão foram penhorados para pagamento da dívida que, inicialmente, era de R$ 169,5 milhões e até abril deste ano, com os valores corrigidos, já havia ultrapassado a quantia de R$ 1 bilhão.

Embora caiba recurso no Tribunal Regional Federal (TRF) e já tenha ocorrido o depósito dos R$ 55 milhões na Caixa Econômica, Luiz Estevão disse que não pretende recorrer, o que significa não apenas sua confissão de culpa, mas sinal de esperteza: o ex-senador acha melhor que o caso seja encerrado dessa maneira, pois irá pagar muito menos do que roubou (junto com o juiz Lalau) dos cofres públicos e do que pagaria em valores atuais.

Apesar do ineditismo (o valor tão alto a ser devolvido à União), achar que a punição aos culpados seguiu os rigores da Justiça soa como um escárnio à nossa inteligência. Luiz Estevão sai desse episódio em vantagem e atesta mais uma vez que, em alguns casos, o crime compensa. Lalau, cumprindo prisão domiciliar em luxuosa residência, até hoje não pagou os R$ 14,5 milhões alusivos à sua condenação.

Antes de chegar a esse valor, Luiz Estevão vinha travando longa batalha para, pelo menos, tentar parcelar o seu “débito” em 15 anos e ainda com desconto. No começo do ano, ele declarou que não se tratava de “assumir a culpa e nem estava arrependido”, apenas queria se livrar do “aperto financeiro” causado depois que as contas de suas empresas foram bloqueadas. Segundo consultoria contratada por ele e realizada em 2010, o seu patrimônio foi avaliado em R$ 20 bilhões.

A aplicação da Lei 12.249, sancionada por Lula em 2010, foi uma das últimas tentativas de seus advogados em tirar o seu cliente do “sufoco”, pois ela permite que qualquer dívida com autarquias e fundações seja parcelada em até 15 anos, com descontos acima de 40%.

O que se sabe é que a Secretaria do Patrimônio da União encontrou dificuldades para avaliar o patrimônio de Luiz Estevão devido ao seu “gigantismo”: além dos imóveis registrados em nome do ex-senador, há mais de 1,2 mil atribuídos a “laranjas”. Um advogado da União informou que não há pessoal suficiente para fazer o levantamento de todos os bens, então foram avaliados os mais “significativos”.

Enquanto “ladrões de galinha” penam por muitos anos atrás das grades imundas do nosso falido sistema carcerário, sem direito a um julgamento decente (quando há!), os de “colarinho branco” conseguem se safar dos “rigores” da lei e continuam agindo impunemente. Além de desviarem milhões de reais dos cofres públicos, quando “condenados” são “presenteados” com redução de valores, descontos, parcelamentos e uma infinidade de recursos conseguidos através de advogados muito bem pagos.

O cidadão comum continua sendo escorchado por altíssimos impostos nem sempre bem aplicados, “intimidado” a cumprir seu papel de contribuinte e a pagar suas contas em dia, sob pena de juros, multas, suspensão de serviços por atraso e tantas outras punições que parecem apenas recair sobre aqueles que se esforçam para agir decentemente. Aos corruptos e corruptores, dá-se a liberdade (até mesmo o incentivo) para que continuem praticando os mesmos crimes, numa clara demonstração de que em nosso País andar “fora da linha” pode ser sinônimo de sucesso.